domingo, 12 de fevereiro de 2017

CARTA DE REPÚDIO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS AO AUMENTO DO NÚMERO DE DESEMBARGADORES NO TJAM E À AMEAÇA DE EXTINÇÃO DA VARA ESPECIALIZADA EM CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Vivemos tempos de cruel retrocesso em nossos direitos fundamentais, lutados e conquistados na Carta Cidadã de 1988. É congelamento no recurso da saúde, da educação, aumento do tempo de contribuição para aposentadoria, ataque aos direitos das/os trabalhadoras/es, dentre outros.
Enquanto nosso olhar se volta para essa conjuntura, no Amazonas estamos sendo alvejadas/os com grandes golpes em nossos direitos fundamentais, seja pelo Executivo apoiado pela maioria do Legislativo Estadual – fraude na saúde, segurança pública incapaz de dar segurança, sistema prisional que elimina seres humanos (...) -, mas também pelo Judiciário. Este último, geralmente escapa dos olhos das cidadãs e dos cidadãos e por isso faz e acontece com o dinheiro público sem sofrer quase nenhum controle social de suas atividades, tanto administrativas quanto judiciais.
Nós, Movimentos Sociais, cidadãs/aos, lutadoras e lutadores por direito, entretanto, temos acompanhando com muita indignação e revolta a decisão do atual Presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas que, com grande presteza e rapidez, logo após assumir, anunciou que iria nomear os novos Desembargadores, mesmo ainda pendente de julgamento recurso no STF que questiona a constitucionalidade da LEI RELÂMPAGO (Lei n° 126/2013) – em menos de 48 horas foi enviada pelo Tribunal de Justiça, aprovada pela Assembleia Legislativa, sancionada e publicada pelo Executivo – que aumentou de 19 para 26 o número de Desembargadores do TJAM.
De acordo com informação da Presidência anterior do TJAM a despesa, somente para o pagamento (remuneração mensal, benefícios e encargos sociais) dos mais 7 desembargadores e seus assessores – sem contar estruturação física (espaço físico, aquisição e manutenção de veículos, contratação de motorista e aquisição de mobiliários) -,  custava aos cofres públicos, no ano de 2015, mais de 10 milhões ao ano.
O Relatório da Justiça em Números, 2016, do CNJ, demonstra que o 2º grau já concentra expressiva despesa com cargos e funções comissionadas (37% para cargos comissionados e 54% das funções comissionadas), causando verdadeiro descompasso na distribuição de cargos e funções comissionados entre os graus de jurisdição (pg. 147). Afirmou que, apesar de o 1º grau apresentar os maiores índices de pro­dutividade dos magistrados e dos servidores e de atendimento à demanda, do que aqueles observados no 2º grau (PG. 115), o primeiro grau ainda possui maior quantidade de casos novos, maior carga de trabalho por magistrado e servidor da área judiciária (p. 107), e demonstra que a carga de trabalho do 1° grau cresceu em proporções ainda maiores no ano de 2015 (pag. 108).
De acordo com esses dados do CNJ não há interesse público que justifique a investidura de novos desembargadores em prejuízo ao primeiro grau e à política de priorização deste grau de justiça.
Nós cidadãs e cidadãos sofremos na “pele” as consequências dos números e constatações do CNJ: na capital, convivemos com a lentidão inaceitável dos processos, as varas especializadas Maria da Penha, – mais utilizadas pelo Movimento de Mulheres -, não respondem estruturalmente e processualmente às necessidades sociais e objetivos constitucionais;  no interior do Estado, há ausência de juízes ou quando tem, os juízes trabalham, ainda em maioria, precariamente, sem servidores, sem estrutura de trabalho.
Lidamos diariamente com um Judiciário distante do povo, fechado em gabinetes – salvo as exceções – que massacram com suas decisões os mais empobrecidos/as, que não raras vezes fazem conluio com os ricos-opressores, com outros poderes, para negar direitos fundamentais, ferindo a Constituição, descumprindo os objetivos constitucionais para os quais o Judiciário existe.
Nós, brasileiras e brasileiros, pagamos preço altíssimo para manter os Poderes do Estado, e nesse particular o Poder Judiciário. Financiamos a remuneração de juízes, desembargadores e seus assessores, sem ter o retorno eficiente e eficaz aos nossos direitos fundamentais ao processo justo, à duração razoável do processo.
Recentemente recebemos a notícia de que o Presidente Flávio Pascarelli pretende extinguir a Vara especializada de crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes alegando falta de recurso. É ultrajante à coletividade uma afirmação dessa quando por sua decisão administrativa ele nomeia novos desembargadores que mensalmente tem custo unitário de mais de 75 mil reais (remuneração do desembargador + assessores).
De acordo com o Relatório do CNJ, e com a realidade da justiça local, é clara a ausência de interesse público para nomeação de novos desembargadores, não tem fundamento a obsessão e a pressa do Presidente para investi-los.
Com essa Decisão administrativa do Presidente Flávio Pascarelli, nosso dinheiro conquistado com o cansaço, suor e sofrimento das trabalhadoras e dos trabalhadores servirá para colocar mais 7 deuses em seus olimpos. Vamos ver mais de 10 milhões que deveriam ser aplicados na justiça de primeiro grau, nas varas Maria da Penha, na Vara especializada de crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes - onde ainda conseguimos chegar - ser desviado para sustentar mais privilégios dos remanescentes patrimonialistas-invasores, na travestida “colonização” de 1500.
O Presidente do TJAM descumpre a Política Nacional de atenção prioritária ao primeiro grau de jurisdição estabelecida pelo CNJ, ofende o princípio da indisponibilidade do interesse público pois ao deslocar recursos para prover cargos de Desembargadores prejudica a estruturação da justiça de primeiro grau, para atendimento eficiente, efetivo e eficaz para a maioria das/os cidadã (aos), inclusive ameaçando extinguir uma Vara especializada essencial.
É um escárnio ao interesse público que um administrador ao seu bel prazer, disponha, contrarie o interesse da coletividade para priorizar o interesse de poucos.
É desumano, é cruel, é injusto que seja empregado mais de 10 milhões ao ano para pagamento de desembargadores enquanto no Estado do Amazonas mulheres e crianças morrem nas maternidades por desestrutura; o IML não tenha estrutura para fazer exames básicos; a delegacia da mulher, da criança, do idoso e as polícias em geral, não tenham o aparato necessário para atender com eficiência e eficácia as nossas necessidades; a Defensoria Pública – única que ainda caminha ao nosso lado – tenha que cumprir suas funções com um orçamento imoral (73 milhões) perto dos valores repassados ao Poder Judiciário (564 milhões) e ao Ministério Público (215 milhões); que as instituições de assistência social, que previnem e tratam as mazelas sociais, tenham que mendigar por recurso público para realizar suas atividades de essencial interesse coletivo.
É igualmente vergonhoso sentir o silêncio do Ministério Público – guardião da sociedade -, da OAB, que vendo o caos do Estado sequer são capazes de emitir uma nota. Na verdade o silêncio significa para nós omissão e conivência porque também estão interessados (cada um) em sua vaga para “virarem” desembargadores, recebendo os altos salários e status. São na verdade, em grande parte, classe de juristas patrimonialistas, oligárquicos, interesseiros, individualistas que, herdeiros das castas espoliadoras, se preocupam muito com seu “umbigo” e quase nada com a realização dos direitos fundamentais da maioria da população e daqueles para os quais o direito de acesso à justiça ainda é uma utopia ou um desconhecido.
Por tudo isso, com a força da indignação, os movimentos sociais abaixo identificados vêm a público repudiar a decisão administrativa do Desembargador Flávio Pascarelli de nomear novos desembargadores em prejuízo da estrutura de primeiro grau, em prejuízo à coletividade.
Além de repudiar requeremos que os mais de 10 milhões (fruto do nosso trabalho) sejam destinados para as varas Maria da Penha, para manter a Vara especializada de crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, para estruturar o IML, para a Delegacia da mulher, do idoso, da criança – pois antes de chegar ao Judiciário passamos por estes órgãos que trabalham precariamente.
Requeremos que esses mais de 10 milhões sejam divididos com a Defensoria Pública do Estado do Amazonas para que possam defender nossos direitos, para a justiça de primeiro grau, para instituições de assistência social da sociedade civil organizada que luta para que adolescentes e jovens não caiam na marginalidade, não tenham perdida sua dignidade.
Por justiça e igualdade LUTAMOS! NENHUM DIREITO A MENOS!
Manaus 12 de fevereiro de 2017.
FÓRUM PERMANENTE DAS MULHERES DE MANAUS - FPMM/AMB
MOVIMENTO FEMINISTA MARIA SEM VERGONHA
GUERREIRAS AMAZÔNICAS EM MOVIMENTO – GAM
MOVIMENTO DAS MULHERES NEGRAS DA FLORESTA - DANDARA
GRUPO DE ESTUDO, PESQUISA E OBSERVATÓRIO DE GÊNERO POLÍTICA E PODER – GEPOS
UNIÃO BRASILEIRA DE MULHERES - UBM
ASSOCIAÇÃO DE ARTESÃOS INDÍGENAS DE MANAUS AMAZÔNIA VIVA – AIMAV
MOVIMENTO DE MULHERES SOLIDÁRIA DO AMAZONASMUSAS
ARTICULAÇÃO DAS MULHERES HOMOAFETIVAS E ALIADAS DO AMAZONAS – ALMAZ
INSTITUTO CULTURAL AFRO MUTALEMBÊ – ICAM
ESPAÇO FEMINISTA URI HI
PASTORAL OPERÁRIA DA ARQUIDIOCESE DE MANAUS - GT DE MULHERES DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
INSTITUTO AGOSTIM CASTIJAN
ASSOCIAÇÃO NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO
ASSOCIAÇÃO DE DONAS DE CASA DO ESTADO DO AMAZONAS – ADCEA
MARCHA MUNDIAL DE MULHERES/AM
LEVANTE POPULAR DA JUVENTUDE
CASA DA CULTURA DO URUBUÍ – CACUÍ/PRESIDENTE FIGUEIREDO
PASTORAL DA CRIANÇA DA ARQUIDIOCESE DE MANAUS - ESTADUAL
FÓRUM DE LÉSBICAS, GAYS, BISSEXUAIS, TRAVESTIS E TRANSEXUAIS DO AMAZONAS - FLGBT/AM
COMUNIDADES ECLESIAIS DE BASE DO REGIONAL NORTE 1/AMAZONAS E RORAIMA
RÁDIO A VOZ DAS COMUNIDADESMANAUS
CONSELHO DE LEIGOS E LEIGAS DA ARQUIDIOCESE DE MANAUS

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