segunda-feira, 6 de março de 2017

A nova geração de feministas brasileiras

“Tem gente que pensa que o 8 de Março é o dia de homenagear as mulheres, de dar flores, dizer que elas enfeitam o mundo. Mas não é. Esse é um dia de luta, da luta feminista”, faz questão de lembrar a militante Priscilla Caroline Brito, de 23 anos. A jovem de Brasília trabalha no Centro Feminista de Estudos e Assessoria, o CFEMEA, além de escrever no site “Blogueiras Feministas”. Ela faz parte de uma nova geração de mulheres que luta pela igualdade de gêneros no Brasil.

Depois de conquistarem o direito ao voto na década de 30, de verem criada a Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher, em 1985, e de festejarem a sanção da Lei Maria da Penha, em 2006, as feministas brasileiras ainda têm muitas causas pelas quais lutar.
— O feminismo está longe de acabar. Ainda reivindicamos a legalização do aborto, os direitos reprodutivos, a liberdade sexual, a autonomia sobre o corpo, a paridade na política, o trabalho digno, a igualdade nos salários e o combate à violência doméstica — enumera Priscilla, que foi criada por mãe solteira. — Cresci vendo minha mãe sofrer discriminação por ser uma mulher com autonomia e três filhas para criar. Sei que ainda temos muitos preconceitos para derrubar.
 
 
Considerado um dos movimentos mais bem-sucedidos do século XX, o feminismo tem passado por uma reforma. Cai a imagem de uma militante sisuda e entram em cena manifestações mais irônicas e até bem-humoradas. Segundo a mineira Anna Steel, que tem 19 anos e, junto com a parceira de luta Sara Winter, organiza o braço brasileiro do Femen, a mudança da imagem da feminista está colaborando para aceitação do movimento.
— Se você perguntasse para alguém, há alguns anos, o que era uma feminista, muitos diriam: uma lésbica ou uma solteirona de 40 anos que não se depila. Hoje, quando você faz a mesma pergunta, muita gente já reponde que é uma mulher que luta pela igualdade de gênero — diz Anna, acrescentando que, dos cerca de dez e-mails que o Femen Brasil recebe por dia, seis deles são de meninas de 15 a 18 anos. — Se, antes, queimávamos sutiãs, hoje, tentamos queimar o moralismo.
Até a queima dos sutiãs da década de 60 foi substituída. Ela deu lugar ao topless — forma utilizada por grupos como o Femen, criado na Ucrânia, para chamar atenção da sociedade para a luta pela liberdade sobre o corpo.
— Quando a gente tira a roupa, é para mostrar às pessoas que costumam se apropriar e vender o corpo da mulher que somos nós que detemos o poder sobre nossos corpos. Nós podemos fazer o que quisermos com ele e isso não diz respeito a ninguém — defende Anna Steel.


A forma de disseminar a ideologia também não é mais a mesma. Hoje, as garotas e mulheres usam a internet como principal arma de articulação. A Marcha das Vadias, que, como o Femen, prega a libertação do corpo feminino, conseguiu reunir, em 2012, cerca de 3 mil pessoas em Brasília, uma das cidades onde ela acontece. E toda a mobilização foi feita pelas redes sociais.
— Usamos listas de e-mail, Facebook e Twitter não só para convocar as companheiras, como também para discutir as diversas vertentes do feminismo. A informação é uma forma poderosa de luta, e nós estamos reinventando a nossa linguagem — afirma Anna, que também usa a web para se comunicar com a matriz do Femen, na Ucrânia. — Fazemos reuniões semanais, e nada disso seria possível sem a internet.
Anna se mudou de Belo Horizonte para o Rio há duas semanas para, justamente, ficar mais próxima dos grandes eventos esportivos que começarão a acontecer na cidade a partir de junho, quando será realizada a Copa das Confederações.
— Já estamos elaborando protestos contra o turismo sexual para essa época, mas as manifestações vão se intensificar mesmo durante a Copa do Mundo. A intenção é fazer, pelo menos, duas ações por dia — avisa Anna.
A ditadura da magreza é outro assunto que está sempre na pauta das neofeministas. A carioca Carolina Peterli, de 24 anos, roda as universidades do Rio levando a discussão sobre os padrões de beleza às estudantes.
— Esse é um tema com o qual as alunas se identificam muito. As jovens querem ser aceitas na sociedade, mas precisam ter noção de que muitos dos padrões de beleza não são saudáveis. Não é preciso ter um peito grande ou pesar 40 quilos para ser amada. Conversamos muito com as meninas sobre isso — comenta Carolina, recém-formada em Relações Internacionais pela PUC.
Esta semana, a Escola Politécnida da USP entrou na pauta de discussão das feministas por conta de um trote repleto de “brincadeiras” machistas. Na lista de atividades havia itens como “jogar elásticos em uma caloura de biquíni” ou “filmar bixetes lavando um carro de camiseta branca”.
— Os homens e mulheres que estão nas comissões de trote muitas vezes reproduzem a visão que objetifica a mulher. E ainda agem como se fosse algo natural, como se fosse brincadeira. Por isso, fazemos uma campanha pelos trotes não machistas nas universidades. As meninas também devem denunciar — orienta Carolina, da Marcha Mundial das Mulheres. — Não queremos ser caretas, mas o campus tem que ser um espaço de confraternização, não de veteranos se sentirem superiores.
Segundo a paulista Natalia Totta, que tem 23 anos e é associada ao Femen, há outros momentos do dia a dia das jovens nos quais o machismo aparece.


— Quando pagamos menos para entrar na balada, é porque estamos sendo usadas como iscas para atrair homens. Isso é uma forma de tratar as meninas como objetos — define Natalia, apontando que, em muitos casos, as próprias garotas reafirmam a visão machista: — Quando meu namorado olha para um menina na rua, por que eu chamo ela de vaca? O porco é ele. Sejamos mais solidárias, mulheres!

— A unidade só beneficia o movimento. Por isso, devemos buscar os pontos de convergência e não deixar que as diferenças nos enfraqueçam.



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